3 de nov. de 2007

Ensino do Design:

ALVARES, M. R. Ensino do Design: A Interdisciplinaridade na Disciplina de Projeto em Design. Florianópolis: 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFSC, 2004. 163p.

RESUMO
A nova realidade social, a modernização dos meios de comunicação e os impactos desses processos nos costumes e hábitos, têm desafiado os pesquisadores da área de Design a redefinirem e a desenvolverem novos procedimentos teórico-metodológicos que possam compreender essas mudanças e que dizem respeito aos novos modos de "pensar, agir e projetar", na medida em que as antigas convenções, crenças e referências estão sendo pulverizadas e dissolvidas. Nesse contexto, há uma notória preocupação por parte de diversos pesquisadores do Design, em repensar e reconstruir orientações metodológicas e epistemológicas que contemplem os processos e as transformações dinâmicas, que envolvem e permeiam a complexa sociedade contemporânea. O primeiro passo dessa tentativa tem sido apontar e romper com os pressupostos e métodos educacionais calcados na fragmentação e pulverização dos saberes, que impedem a integração no ensino. O objetivo principal do trabalho é identificar e evidenciar a presença de manifestações interdisciplinares na disciplina de Projeto, mais especificamente, no Projeto de Desenvolvimento de Produto, nos cursos de graduação em Design. Com esse propósito, analisaremos a complexidade das diversas disciplinas, competências e habilidades que se entrecruzam na disciplina de Projeto de Produto, na tentativa de observar como os programas e projetos pedagógicos atuais incorporam as novas propostas metodológicas, capazes de promover o desenvolvimento integral do indivíduo, bem como sua interação com o meio social. Para a construção do alicerce teórico-metodológico, partiremos de múltiplas referências destacando o conceito de interdisciplinaridade. Ao incorporar esse conceito, nossa intenção é ampliar as perspectivas apontadas pelos educadores e pesquisadores que discutem e analisam a complexidade de saberes, produzidas e articuladas no contexto do Design.

Palavras-chaves: Design, Ensino, Interdisciplinaridade, Inter-relação disciplinar, Currículo.


(....)
4.5.1 Metodologia projetual

O interesse pela metodologia não está limitado exclusivamente às profissões de projeto e planejamento. A sua utilização tem sido uma prática adotada, durante várias décadas, em outras atividades industriais, tais como administração, engenharia de produção, contabilidade e marketing, assim como em atividades não industriais tais como teatro, pintura, composição musical, composição literária, filosofia, ciências, profissões de bibliotecário, trabalho social, ensino e planificação militar. Todos estes métodos sugerem a busca coletiva, não só de novos procedimentos, como também de novos objetivos, e um novo nível de realização.

Para de ilustrar e demonstrar as possíveis organizações clássicas do processo de design adotadas por profissionais e estudiosos da área selecionou-se alguns exemplos de seqüências ou macro-estruturas projetuais:

Christopher Jones (apud Fontoura, 2001) não desenvolveu propriamente um método, seu trabalho é mais conhecido como uma antologia dos métodos. "Jones divide o esforço de design em duas partes, uma fase que leva a cabo a busca de um design adequado e outra que controla e avalia o sistema de busca – controle estratégico" (JONES apud FONTOURA, 2001, p.83).
Para Christopher Jones (1978) as principais etapas metodológicas são:
- Problema
- Divergência
- Transformação
- Convergência
- Avaliação

Morris Asimov (1968) concebe o processo de design de maneira similar ao da informação – com bases na teoria da informação. A atividade projetual assim entendida, consiste basicamente na coleta, manejo e organização criativa de informações relevantes da situação problema; a prescrição e derivação de decisões otimizadas, a comunicação, a avaliação e a comprovação; e tem um caráter interativo.
Para Asimov (apud Fontoura, 2001) as principais fases e etapas são:
(1) Fases Primárias: identificação da necessidade, estudo de factibilidade ou exeqüibilidade, e projeto preliminar;
(2) Fases do ciclo de produção e consumo: projeto detalhado, planejamento da produção, planejamento da distribuição, planejamento para o consumo, e planejamento para a retirada.

Bruce Archer (apud Fontoura, 2001) apresentou sua proposta metodológica entre 1963 e 1964, nela procurou sistematizar o processo. Na descrição do método, Archer define o design como um processo que consiste em selecionar os materiais corretos e dar-lhes forma para satisfazer as necessidades de função e estética, dentro das limitações dos meios de produção disponíveis. Assim, o processo de design procura conciliar uma ampla gama de fatores e envolve etapas de análise, de criação e de execução.
Estas etapas envolvem por sua vez:
(1) Fase analítica: a definição do problema e preparação do programa detalhado; a obtenção de dados relevantes – informações –, preparação de especificações e com base nestas atividades, realimentar a fase analítica;
(2) Fase criativa: a realização da análise e da síntese dos dados para a preparação das propostas de design; o desenvolvimento de protótipos; a preparação e execução de estudos e experimentos que validem o design; e
(3) Fase executiva: a preparação de documentos para a produção.

Hans Gugelot (apud Bürdek, 1999) desenvolveu a sua proposta metodológica durante o período que esteve na HfG-Ulm – Hochshule für Gestaltung de Ulm, propondo uma seqüência de atividades projetuais básica para o design de produtos industriais.
A proposta de Gugelot consiste nas seis fases do projeto:
(1) Fase de informação: obtenção de informações sobre a empresa para a qual se vai trabalhar – propriedades, tipos de produtos, programas de desenvolvimento, infra-estrutura produtiva, sistema administrativo –, e sobre os produtos similares no mercado;
(2) Fase analítica: investigação das necessidades dos futuros usuários, do contexto do produto, aspectos funcionais e sobre novos métodos de produção, obtendo-se assim os requerimentos do projeto;
(3) Fase de projeto: exploração de novas possibilidades formais e estudos tipológicos;
(4) Fase de decisão: apresentação da proposta de design aos responsáveis pela sua venda e pela sua produção – incluindo estudos de custo/benefício e de viabilidade técnica;
(5) Fase de cálculos e adaptações: ajuste do design às normas e aos padrões de materiais e de produção; e
(6) Construção de modelos e protótipos: realização de provas e avaliações com base nos objetivos iniciais.

Christopher Alexander (apud Fontoura, 2001), em 1973 concebe o design como um processo de adaptação de uma forma a um contexto não controlado pelo designer e que este contexto é formado pela situação física, pelo uso e pelos métodos de fabricação. Considera que em todo o problema de design existem dois componentes: o primeiro é formado pelas exigências fora do controle do designer - contexto - e o segundo é a forma que o designer deve adaptar à primeira.
Os principais passos de sua metodologia são:
1. Definição do problema mediante uma lista que deixe claro seus limites e seus requisitos.
2. Mediante uma lista de exigências, se estuda o comportamento de todos os sistemas do contexto.
3. Sobre cada par de exigências se faz um julgamento com o objetivo de determinar se as soluções de uma exigência estão determinadas pela outra.
4. Analisa-se e decompõe-se a matriz resultante do passo anterior e estabelece-se uma hierarquia de subsistemas.
5. Por meio de diagramas encontra-se uma solução às exigências de cada subsistema.
6. Desenvolvem-se os diagramas até obter-se um projeto que seja a síntese formal das exigências.

Gui Bonsiepe, ex-aluno e ex-professor da HfG- Ulm, foi fortemente influenciado pela tradição racionalista daquela escola e a metodologia de design por ele proposta é bastante objetiva.
Conforme descrito em Bonsiepe (1978), as principais fases são:

1. Estruturação do problema projetual
1.1. Detectar uma necessidade
1.2. Avaliar a necessidade
1.3. Formulação geral do problema projetual
1.4. Formulação detalhada do problema
1.5. Subdividir o problema em subproblemas
1.6. Hierarquizar os subproblemas
1.7. Analisar as soluções existentes

2. Projetação
2.1. Desenvolver alternativas
2.2. Verificar e selecionar alternativas
2.3. Detalhar a alternativa escolhida
2.4. Construir o protótipo
2.5. Avaliar o protótipo
2.5.1. Introduzir eventuais alterações
2.5.2. Construir protótipo modificado
2.5.3. Preparar planos técnicos para a fabricação

3. Realização do projeto
3.1. Fabricar pré-série
3.2. Elaborar estudos de custo
3.3. Adaptar o design às condições específicas do produtor
3.4. Produzir em série
3.5. Avaliar o produto depois de lançado no mercado
3.6. Introduzir eventuais modificações

Para Don Koberg e Jim Bagnall (apud Bürdek, 1999) denominam o processo de ‘The seven universal stages of creative problem-solving’. Para os autores, o processo de design é um guia universal. Esta proposta situa-se também, na tradição das metodologias clássicas de design.
O processo é similar a uma viagem na qual, aos poucos, se vão solucionando problemas, podendo ser concebido de diversas formas:
(1) como um processo linear que se realiza passo a passo;
(2) como um processo circular, já que pode existir uma continuidade, isto é, não há necessariamente um início nem fim;
(3) como um sistema retroativo perpétuo; ou
(4) ainda como um sistema ramificado.

A seqüência é 101 constituída por:
- Reconhecimento do problema – ‘comprometendo-se’
- Analise do problema – ‘pesquisando-se’
- Definição do problema – ‘destinando-se’
- Desenvolvimento de idéias – ‘buscando-se opções’
- Seleção – ‘tomando-se decisões’
- Realização – ‘agindo-se’
- Avaliar – ‘avaliando-se’

Gustavo Bonfim, designer brasileiro, dedicou vários estudos a questões relacionadas com a metodologia do Design. No seu trabalho ‘Fundamentos de uma metodologia para o desenvolvimento de produtos’, os autores, Bonfim et al. (1977) propõem uma metodologia de aplicação no campo do ensino.
A metodologia segue as seguintes fases:

1. Problematização
1.1. Compreensão da necessidade
1.2. Descrição dos processos de soluções
- Avaliação dos processos
1.3. Compreensão do processo definido
- Descrição dos subprocessos existentes e possíveis
- Avaliação dos subprocessos
- Descrição dos sistemas de produtos
- Avaliação dos sistemas de produtos

2. Análise
2.1. Levantamento dos produtos do sistema eleito
2.2. Análise dos produtos

- Avaliação dos produtos

3. Desenvolvimento
3.1. Interação dos fatores do produto
- Geração de alternativas dos fatores
3.2. Geração de alternativas de produto
- Representação das alternativas de projeto
- Avaliação das alternativas de produto

4. Implantação
4.1. Meios de representação para o processo de fabricação
- Testes de verificação dos protótipos
4.2. Produção piloto
4.3. Lançamento do produto no mercado
- Comportamento do produto no mercado

Mais recente, o designer inglês Mike Baxter publicou em seu livro ‘Projeto de Produto: guia prático para o desenvolvimento de novos produtos’ uma metodologia e técnicas específicas para o projeto. Ao contrário de Bonfim e outros autores que desenvolveram metodologias e métodos com finalidades didáticas, Baxter desenvolveu sua metodologia para aplicação em empresas, ou seja, orientada para o mercado.

A organização das atividades de projeto para Baxter (1998) se inicia quando é dada a partida para o desenvolvimento de um novo produto. O Quadro 19 ilustra a seqüência da metodologia proposta.

1. Nas empresas, essa etapa consiste da apresentação de idéias básicas que serão submetidas a testes (primeiro) das necessidades do mercado, incluindo potenciais consumidores, vendedores e outros conforme cada caso em especial.

2. Numa segunda etapa serão elaboradas as especificações da oportunidade e especificações de projeto, passando pelo desenvolvimento do projeto conceitual para a seleção da melhor alternativa. O Conceito selecionado é submetido a um (segundo) teste de mercado.

3. Se o teste for satisfatório, serão iniciadas as atividades de configuração do produto. Nessa etapa é comum detectar alternativas do projeto não consideradas anteriormente ou promover alguma alteração técnica envolvendo materiais e processos de fabricação. Isso pode levar ao retrocesso no processo, para se verificar as implicações das alterações com relação ao planejamento inicial. Geralmente o tempo gasto nas revisões de projeto é geralmente inferior ao desenvolvimento inicial, uma vez que o caminho já é conhecido. Chegando novamente à configuração do produto, é selecionada a melhor alternativa que será mais uma vez submetida a testes (terceiro) de mercado.

4. Sendo aprovado, passa-se para o detalhamento, através de desenhos do produto e seus componentes, e a construção de um protótipo experimental. Nessa etapa é definido o detalhamento final dos componentes, montagem do produto, e é possível efetuar testes físicos ou de funcionamento do produto. Uma vez acertados os detalhes, é confeccionado, em alguns casos, um protótipo de produção onde serão definidos os parâmetros para a o processo de produção na indústria. A aprovação desse modelo ou protótipo final encerra o processo de desenvolvimento do produto em questão. A partir desse ponto, começa-se a produção e o lançamento do produto no mercado.


Quadro 19 - Atividades de projeto nas diferentes etapas do desenvolvimento de produtos

Fonte: (BAXTER, 1998, p.16)

Vimos nas metodologias apresentadas, que apesar das suas diferenças, elas se convergem em vários pontos de semelhança, principalmente que os projetos se iniciam a partir de um problema ou necessidade a ser comprida e se encerram na solução desse problema ou atendimento à necessidade. Diferenciam-se umas das outras no número de passos, fases ou etapas, porém todas procuram estabelecer uma seqüência uma ordenação lógica para o desenvolvimento de um projeto em design.


Na prática, entretanto, estruturas nem sempre se apresentam tão bem definidas ou tão claras como no papel. O andamento de um projeto sempre se difere de outros com mesma natureza. As abordagens ao problema são sempre diferentes e estão sujeitas concepções, aos entendimentos, conhecimentos, experiências do designer e à orientação dada por ele ou pela equipe de projeto. Elas servem apenas como orientações, jamais caminhos fixos e invariáveis. Por outro lado, tem-se consciência da função e importância da adoção dos métodos para a organização do trabalho do designer, como comentado por Fontoura (2001).

(ALVARES, M. R. [2004], pp. 98/104)